quarta-feira, 18 de julho de 2012

Libertadores Genérico




  Desde cedo já havia começado a preparação do que seria mais tarde a comemoração do título inédito do Corinthians. Fazia tempo que não via a cidade assim. Bandeiras sobre os carros, nas janelas, nas costas de pedestres. Cornetas, vuvulzelas. Motoqueiros com capa de super herói com o símbolo do time. Que é um timão. Com uma âncora e dois remos atrás. Timão é o nome dado a roda ou volante com que se manobra o leme do navio. E também é o aumentativo de time. E é o símbolo do time Corinthians.  Só mais uma curiosidade: a pronúncia de “menininhas” em grego é “corinthias”. Mas quase ninguém sabe disso, e bambi, torcida de menininhas, acabou sendo fama que ficou para um outro time paulistano. Vai entender.
  Muita gente de camisa oficial, faxinha na cabeça andando pela rua. Me lembrou nos anos 90 quando o São Paulo ganhava um monte de campeonatos, e eu sãopaulina, estava no lugar deles hoje. No rádio um torcedor diz “hoje é um daqueles dias que você não vê a hora de passar e quando chegar a noite não quer que acabe nunca mais”. Ele estava certo. Realmente demorou pra acabar.
  Fico pensando que piadas vamos fazer contra o Corinthians agora, já que a principal que mais os irritava, não terá mais efeito. Eu adorava perguntar: “Você sabe oque faz um corinthiano depois de ganhar a Libertadores?”. Resposta: “Ele desliga o play-station e vai dormir”.  Na realidade transformaram o dia seguinte de Campeões em feriado!
Três da manhã e ainda ouvia-se os berros, os gritos masculinos e femininos, as buzinas. Quatro e meia e ainda tem fogos de artifício explodindo.  Olho no rádio relógio na escuridão do quarto e são seis da manhã e em coro escuto “timão êo”. Era a feira sendo montada na rua de trás de casa. Quando achei que as seis, conseguiria dormir, descubro que os feirantes são todos corinthianos e começaram a soltar mais rojões logo cedinho. E cantaram mais um pouquinho antes de começar a trabalhar.
  Claro pela manhã, as dez, lendo o jornal, se vê a quantidade de casos violentos gerados pela alegria corinthiana. Violência, atropelamentos, embriaguês.  Mas eu não posso deixar de observar o quanto a alegria propriamente dita  de todos que estão felizes com o título é positiva. Super positiva, uma energia muito alta! Aquele estádio lotado vibrando em conjunto por uma vitória. Dois milhões de pessoas muito felizes! Uma prova disso é o segundo gol. Creio  que aquele gol foi da torcida. Forte e firme como estava desestabilizou o jogador do Boca que possibilitou que fosse realizado o segundo gol do Corinthians  Oque eu quero dizer é que algum inglês inventou o futebol. E pensou em tudo. A base era: botar vinte e dois caras pra correr atrás da esfera de couro e se organizarem juntos para dominá-la. Quase um treinamento de guerra. Uma forma pacificista de guerrear. E creio ter sido criado por bons motivos, mesmo que o inglês em questão nem tenha percebido.
 O rugby é bem mais violento. A primeira vez que eu fui a um jogo de rugby, no Chile, me lembro de ter ficado muito impressionada. A torcida era completamente diferente. Tinha mulheres com luvas de couro e chapéu. De pernas cruzadas e cara blazet. Quando tinha gol, elas se levantavam aplaudiam e sentavam de pernas cruzadas de novo. Os homens, como sempre, eram um pouco mais enérgicos, mas nada comparada a torcida do timão (apelido do Corinthians) no futebol. Ouvi de um jogador: “o rugby é um jogo rude, jogado por homens cavalheiros. E o futebol é um jogo de cavalheiros jogado por homens rudes.” Concordei na hora, pois no rugby você pode esfregar a cara do indivíduo no barro e não será falta, e eles impressionantemente naquela brutalidade toda, não se machucam como no futebol onde não vale o toque que não seja dos pés na bola!
  Mas é impressionante a movimentação energética que acontece nos jogos. Este ano teremos olimpíadas, gostaria de saber se diminui a violência do mundo nesta época, sem contar a da imprudência do exacerbo da alegria gerada do esporte.
 Estou fazendo espetáculo de improvisação no teatro, e soube que em alguns países o improviso é considerado um esporte. No esporte as pessoas não esperam acabar o espetáculo para aplaudir, elas vibram durante toda a execução do mesmo.
 Uma vez um colega de teatro convocou seu grupo de atores para ir até a Avenida Paulista fazer um intervenção teatral. Eram dias insuportáveis de quente em São Paulo. Os executivos continuavam a se vestir com paletós e gravatas. E a sair para almoçar ao meio dia, quando o sol estava a pino. Muito quente mesmo, estava fazendo quase quarenta graus em clima seco.  Os atores então se vestiram em trajes de banho: biquínis, sungas, chinelos. Munidos de raquetes de frescobol, guarda-sol , e tudo mais que remetia ao que aquele clima propunha: praia.  Eles sugeriam que os passantes de uma Avenida Paulista ao meio dia , lotada, passassem protetor solar, usassem borrifador de água no rosto, jogassem um voleibol ou deitassem um pouco com alguns deles nas cangas estendidas debaixo do guarda-sol, na ilha, em frente ao MASP. O vendedor de sorvete ficou por ali mesmo, compondo a cena realística. Foi o tipo da coisa que além de atrair todos os jornais, como fazem os esportes, simplesmente mudou brutalmente a energia cotidiana daquela Av. Paulista naquele horário.  Como fez a final da Copa Libertadores  com a cidade inteira este ano.   Outra intervenção que este grupo de teatro quis fazer, foi “O  Ano-Novo no meio do ano” na Paulista. Todos de branco, e após a contagem de 10 à 0 gritar “Feliz Ano Novo!!”  bem alto e com veemência! E em seguida abraçar a todos, brindar e desejar muita saúde, felicidade, prosperidade, e todas essas coisas que se desejam um ao outro na passagem de ano. O grupo quis provar que a manipulação de energia acontece, transforma o espaço e tem efeito incrível.
  Pensei que baseado nisso tudo, podíamos criar  uma Copa Libertadores Genérica! Se utilizar dessa paixão, dessa mobilização pra conseguir outras coisas, tão importantes ou mais que chegar ao Mundial em Tóquio. Como acabar com a corrupção por exemplo. Tomar decisões através de jogos .  Haveria as torcidas a favor de idéias que são a favor, ou contra. Imagine como seria um jogo de futebol que decidisse se é necessário cotas para negros nas universidades ou não. Se Demóstenes Torres deve ou não ser preso em vez de cassado. Imagino o tanto de bicheiros e donos de cassinos na torcida.  Se é mesmo necessário usar paletó num calor de quarenta graus. Seria a torcida organizada mais chique de todas, com estilistas do mundo inteiro querendo decidir os modos de vestir com formalidade!  Teria um desfile do vencedor.  Ok, fui longe demais. Fazer oque,  fiquei pensando essas coisas! Afinal não podia dormir. A energia, os gritos, e os rojões não deixavam, tive que pensar em alguma coisa. Um jogo de tenis onde se decida o segundo turno de uma presidência de república! Claro, seria após votações. E ainda depois, iríamos para o teatro encenar as formas, caminhos e cores de governo. Acho que nesse caso as torcidas se mesclariam. Como os políticos fazem, se odeiam ontem, se apoiam hoje. Que venham as olimpíadas! E salve o São Paulo Futebol Clube! 

quarta-feira, 4 de julho de 2012

Templo é dinheiro




  Religião vem do termo religare, em latim. Significa o modo de conectar-se ao que é divino. Templo é o lugar pra se fazer isso. É um ambiente material, custa dinheiro. Não só a estrutura, mas todo seu marketing e divulgação. As igrejas disputam público com os teatros, bares e academias. Afinal é possível religar-se com arte, gastronomia, literatura, ioga, corrida...

Pra mim, nada mais é tão divino quanto um determinado bolo de chocolate com recheio e cobertura, acompanhado de um cafezinho amargo. O templo para isso seria uma doceria. Me conecta com o infinito. Divino para Carlos Aparecido pode ser um doce de cupuaçu, templo: frutaria. E para  Carla Aparecida, o divino nem doce é. Pode ser um churrascão com cerveja num domingo de sol. No quintal de sua casa, seu templo. Para um vegan, divino é uma cenoura crua, fresquinha, e assim por diante.
     
 Tem as três mais antigas  religiões do mundo e um montão de derivadas, paralelas, adjacentes, equivalentes ou congruentes. Tem religião que se religa cantando, ou rezando quieto de olhos fechados. De joelhos com terço na mão repetindo as orações decoradas. Tomando chazinho de mato no meio da floresta. Algumas preferem religar  ao som de batuque bem alto, canto, música, chocalho, incenso, saia rodada, coreografia, comida. Muita festa, charuto. Outras ficam em silêncio por horas. Recitam milhões de vezes  mantra “nam yoho rengue kyo”, “om mani padime hum”, somente "ohm", entre outros representantes do som do universo, ou do som da voz de Deus. Tem gente que conversa com Deus como se fosse um analista. Outros como se ele fosse um pai culpado de tudo isso, e se implora clemência a ele. É como se o indivíduo exigisse seus direitos : “ora meu Deus! Faça-me o favor! O Sr. me botou nessa, agora me ajude, ok?”

 No Brasil podemos ver várias formas de se religar convivendo.  Religiões aqui é quase uma modalidade. Não parece que seja um grande problema as tantas diferenças. Embora o deputado Feliciano Filho do Partido Verde esteja tendo problemas com o Candomblé.  É que desde o começo do ano ele está tentando aprovar a lei que proíbe o sacrifício de animais em rituais religiosos. A lei prevê multa de até 5 mil reais para quem botar galinha assassinada em alguma encruzilhada.  A lei não proíbe o assassinato do perú de Natal. Pois serve para alimentar o corpo físico do católico e não para agradar a nenhum Exu. Ou qualquer que seja o  orixá precisado do "trabaio". A Umbanda que é mistura de Candomblé com Jesus Cristo e outros santos católicos, não se manifestou. Mandar perfumes para Yemanjá continua liberado. A morte das plantas de Alfazema não altera a sustentabilidade ambiental restabelecida na Rio mais 20.  O bom cheiro do perfume é até bem vindo. Quem não deve curtir muito o ritual são os garis da praia, que limpam toda a devolução de presentes que fazem de oferenda á Santa. É bom para o mercado interno que Yemanjá prefira Alfazema. Como rainha do mar, ela já deve ter conhecido outras fragrâncias, como a Verbena Chilena, ou os aromas de Capri, porém permanece fiel a erva brasileira. Conservadora, ela também continua receitando as mesmas “ervas de corte” aos seus filhos se protegerem, há tempos.

 Religião sempre se misturou com política?  O Oriente Médio que o diga.  Vi no jornal há poucos dias : " Os católicos apoiam o ditador da Síria". Talvez porque queiram ver a Síria transformada no grande templo deles?

  Se me oferecessem, quando eu comecei a votar aos 16 anos, uma merenda de bolo de chocolate na escola pública que estudei, no lugar daquelas malditas bolachas de maisena murcha, com café ruim e leite em pó, ou macarrão parafuso com salsicha, é capaz que eu tivesse sim repensado meu voto. Iria aprender matemática conectada ao que me conecta ao divino: chocolate. Servido no intervalo. Provavelmente teria sido uma aluna e pessoa melhor em sala de aula. Um ser humano melhor.    Oque é bom pra mim seria bom pra todos ao meu redor. Afinal, com a alma aquietada pelo chocolate de qualidade (meu fator religante que me traz paz) não teria feito tanto bulling em meus coleguinhas. Teria sido uma adolescente menos revoltada, portanto instrumento de Deus e mais útil a sociedade que eu fazia parte. Aliás é por isso mesmo que na guerra os soldados comiam mal. Se comessem bem, não guerreavam direito. É mais ou menos por isso que religião e política sempre se precisaram.

  Falando em adolescência, como não mencionar a MC Carol!  Ficou famosa como a "menina pastora". Diva do You Tube.  Aos 5 aninhos ela proclamava: “É maravilhoso!  Conselheiro!”. Mais de um milhão de views. A menina cresceu e continua crente da Assembléia de Deus (não a que  estuda a lei de Feliciano) e recebe uma porcentagem do Google pela obra. Que é hilária. Me diverti mais com a menina pastora e seus funks, do que com muita cena de comédia em teatro por aí. Convincente, sabe? E fofinha, como toda criança, cheia de graça.

 Existe hoje uma outra menina pastora, árabe, chama-se Lara.  Ensinaram a menina que os inimigos roubaram os pais dela, os avós, e que todos os israelenses são do mal. Ela tem um programa de TV e fica dizendo isso nele. Lembra a pequena Maysa do SBT: um estouro! Lara está famosa por lá. Está em todos os jornais e responde a processos onde é acusada de incitar o ódio entre as religiões. 

A Universal do Reino de Deus, que também é crente, mas com uma maior super produção, está construindo lá no Brás, um templo. Tão grande quanto o da João Dias.   Não paga imposto porque é instituição religiosa. Belo negócio.  Quanto deverá custar aquele... monumento  arquitetônico? É uma espécie de  arco do Triunfo da França somado a umas colunas romanas. Um gosto que até Deus duvida. Pega dois quarteirões. É gigantesca. Eles gritam com muita fé, dizendo que tudo é em nome de Jesus. Mas Jesus não era humilde e sem posses? Pois é tudo no nome do Homem, mas no papel material empestado a um nome de algum outro homem. Que provavelmente ficou e ficará cada vez mais rico com aquele empreendimento. 

Dizem que a Universal disputa a tapas fiéis com a igreja Mundial. Mesmo estilo de show, apresentação, só que um pouco mais "dark". Alguém deveria sugerir uma aliança. Um monopólio: a Intergaláctica de Deus?

 E falando das bandas fora deste planeta como não mencionar o mais "templo que é dinheiro" da moda em Hollywood, a Cientologia. Igreja de Tom Cruise, Jhon Travolta e outros “american famous”. Acostumados a roteiros de cinema, os astros adotaram como bíblia, um livro de ficção científica. Que pode até ser verdade. Eu não duvido. Não duvido mesmo. Sugere que somos assim insatisfeitos, porque estamos na Terra exilados. O kardecismo já falou algo parecido em um de seus estudos, mas de forma diferente. A cientologia diz que vivíamos longe daqui, em um lugar onde éramos felizes. Tivemos um problema político com um ET líder deste lugar, que achou que não merecíamos ficar lá.  Nos trouxeram pra cá. Aí começamos a ter descendentes com os animais. Darwin já haveria começado a sacar essa teoria. E como ainda lembramos vagamente do que aconteceu, nunca estamos felizes.  Ficamos o tempo todo tentando lembrar de onde viemos e para onde vamos, pois queremos voltar pra casa. Super interessante!

 Pra finalizar, já ouvi muita gente dizer "minha religião é o teatro”. A minha é espírita, mas é o teatro também. É o cinema. É um livro, um poema, uma flor, uma onda no mar. Ou uma igreja belíssima, fechada com vitrais coloridos. Uma torta de espinafre. Uma tarde de sol com hare-krishnas comendo maçã com canela ao som de mantras. Sería legal experimentarmos todas! Sem sermos fanáticos com nenhuma. Qualquer religião pode de determinada forma, fazer bem a determinado alguém, por um determinado tempo. O ritual, a experiência. Seria um bom começo para respeitarmos mais as diferenças. Fanatismo embora lucrativo, não faz bem em tempo algum. Como ir ao teatro ou ao cinema. Tem dias que quero ver Brecht outro dia cinema americano, outro dia ir a uma quadrilha de festa junina. Um pouco de cada. Na época certa. Sem fanatismo.